
Nas redes sociais, mulheres são constantemente incentivadas a se cuidar. Mas, nos bastidores da vida real, muitas mães aos 40 enfrentam silenciosamente o esgotamento físico e emocional, as flutuações hormonais e a dificuldade de se reconhecer diante do espelho. Para a psicóloga e psicanalista Danielle Meireles, o autocuidado não pode se tornar mais uma forma de cobrança.
A maternidade na faixa dos 40 anos tem crescido no Brasil, acompanhando mudanças sociais, profissionais e pessoais. No entanto, com filhos em idade escolar ou na adolescência, essas mulheres muitas vezes encaram simultaneamente a chegada da pré-menopausa, um período de intensas transformações hormonais e emocionais. Tudo isso somado à exigência de se manter produtiva, afetuosa, em forma e sempre “bem resolvida”. “Existe culpa por tudo. Por estar no trabalho. Por não trabalhar. Por se cuidar demais. Por não se cuidar. E mesmo quando a mulher decide olhar para si, vem uma nova cobrança: que esse autocuidado aconteça do jeito ‘certo’, com maquiagem, cabelo feito, corpo em forma”, aponta Danielle Meireles, que também é mãe de primeira viagem.
Segundo a psicanalista, essa culpa materna não é novidade. “Desde Freud, a maternidade ocupa um papel simbólico muito forte. Na clínica, muitos adultos ainda tentam se desvencilhar da presença simbólica da mãe. E, do outro lado, essa mesma mulher hoje é cobrada para ser tudo: afetuosa, produtiva, bonita e disponível”, diz.
A presença das redes sociais tende a agravar essa pressão, ao disseminar modelos idealizados de mulheres que parecem equilibrar com perfeição carreira, maternidade e vida pessoal. Danielle lembra da época do puerpério, quando ouviu conselhos como a “teoria do brinco” , a ideia de que escovar os dentes e colocar um acessório indicaria que ela estava “se cuidando”. “Mas eu só queria viver aquele momento com meu filho, sem precisar provar nada. E percebi o quanto essa exigência estética pode ser cruel”, afirma.
Para ela, o corpo da mulher durante e após a maternidade está “literalmente a serviço do outro”, um corpo que muda, sente dor, se transforma. Nesse processo, muitas mulheres se perdem de si mesmas. “Por isso, o retorno ao cuidado precisa vir de um desejo genuíno e não de uma imposição social”, defende.
Danielle Meireles acredita que o maior exemplo que uma mãe pode dar ao filho é o da autonomia. “Quando a gente se permite ser mulher, além da mãe, mostramos para os filhos que eles também podem ser livres. Que a mãe é gente. E que crescer é se tornar independente emocionalmente, inclusive”, diz.
Longe da idealização, ela propõe uma nova perspectiva: não existe maternidade sem culpa, mas é possível lidar com ela de forma mais leve. “Ser mãe não precisa significar abrir mão de si eternamente. A maternidade pode ser um espaço de amor e transformação, mas também de liberdade para quem cuida”, finaliza.
Foto: Psicóloga e psicanalista Danielle Meireles.
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