RMA – CARTA ABERTA – DISCUSSÃO JUDICIAL – AS ILEGALIDADES DA TRIBUTAÇÃO DOS LUCROS E DIVIDENDOS – A NECESSÁRIA JUDICIALIZAÇÃO – LEI 15.270/2025 – O MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO PELO SESCON

RMA – CARTA ABERTA – DISCUSSÃO JUDICIAL – AS ILEGALIDADES DA TRIBUTAÇÃO DOS LUCROS E DIVIDENDOS – A NECESSÁRIA JUDICIALIZAÇÃO – LEI 15.270/2025 – O MANDADO DE SEGURANÇA IMPETRADO PELO SESCON

COLUNA RONALDO MARTINS & Advogados

DR RONALDO CORRÊA MARTINS

Como é de conhecimento geral, o SESCON impetrou Mandado de Segurança visando proteger suas empresas associadas da exigência prevista na Lei nº 15.270/2025, que condiciona a isenção do Imposto de Renda sobre lucros distribuídos à aprovação, no próprio exercício, dos resultados apurados. A ação requer que os lucros apurados até 31/12/2025 permaneçam isentos, desde que aprovados em ata até 30/04/2026.

Embora o pedido tenha sido formulado dentro de limites prudenciais, é louvável que a entidade tenha deliberado pelo ajuizamento do Mandado de Segurança. Contudo, a impetração poderia ter avançado no mérito para alcançar todas as hipóteses de inconstitucionalidade existentes, especialmente no que diz respeito à tributação condicionada à deliberação societária referente às reservas de lucros apurados até 2024, constantes das demonstrações financeiras das sociedades empresárias.

Com efeito, a inconstitucionalidade e a ilegalidade da exigência tributária não se limitam aos lucros a serem apurados em 2025, mas atingem igualmente os lucros apurados até 2024 — estoque de lucros acumulados ou a distribuir — que não podem ser submetidos à tributação prevista na Lei nº 15.270/2025, mesmo que a lei condicione a isenção à deliberação societária até 31/12/2025.

Essa exigência viola diretamente o ato jurídico perfeito e o direito adquirido dessas sociedades empresárias, uma vez que tais lucros foram constituídos integralmente sob um regime jurídico de plena isenção. Assim, sua posterior tributação condicionada à aprovação societária configura retroatividade tributária indevida e ofensa ao texto constitucional.

A Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso XXXVI, determina expressamente:

“A lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada.”

O lucro já apurado, reconhecido contabilmente e juridicamente disponível (ainda que pendente de deliberação quanto à distribuição), constitui ato jurídico perfeito, porque:

1.         foi formado integralmente sob legislação que estabelecia isenção plena sobre sua distribuição;

2.         integra o patrimônio jurídico da sociedade e de seus sócios, representando direito adquirido ao regime fiscal vigente à época de sua constituição.

A legislação superveniente — como a Lei nº 15.270/2025 — não pode alterar a natureza jurídica, a disponibilidade ou o regime tributário desses lucros sem violar diretamente o art. 5º, XXXVI, CF/88.

A doutrina majoritária (Carrazza, Torres, Sacha Calmon, Misabel Derzi) é firme ao afirmar que o fato gerador da tributação da renda distribuída não pode retroagir para alcançar períodos pretéritos cujos resultados já se consolidaram, ainda que não distribuídos. Nesse sentido, o STF possui jurisprudência estável reconhecendo que a lei tributária nova não pode modificar efeitos já produzidos por fatos passados consumados.

Por outro lado, a revogação de isenção tributária sem respeito ao princípio da anterioridade é considerada inconstitucional pela doutrina e pela jurisprudência do STF, que entende que tal medida equivale a aumento indireto de tributo.

A Constituição prevê:

•          Anterioridade anual (art. 150, III, “b”);

•          Anterioridade nonagesimal (art. 150, III, “c”).

Ambas protegem o contribuinte de alterações abruptas, preservando previsibilidade e segurança jurídica. O STF afirma reiteradamente que a revogação de benefício fiscal aumenta indiretamente a carga tributária, razão pela qual deve respeitar a anterioridade.

No julgamento envolvendo decretos do Estado do Rio Grande do Sul que revogaram benefícios de ICMS, a Corte decidiu:

“Promovido aumento indireto do ICMS por meio da revogação de benefício fiscal, surge o dever de observância ao princípio da anterioridade geral e nonagesimal.”

Mais recentemente, no Tema 1383 da Repercussão Geral, o STF consolidou o entendimento de que a redução ou supressão de benefícios fiscais deve observar a anterioridade tributária.

Além disso, deve ser privilegiada a segurança jurídica e a confiança legítima, conforme a LINDB. Após a reforma de 2018, a LINDB reforça o dever de proteção à estabilidade normativa:

•          Art. 24: exige que decisões administrativas e judiciais considerem as consequências práticas de mudanças normativas;

•          Art. 30: impede que o Estado surpreenda agentes privados com alterações retroativas e desproporcionais.

A tributação imediata de lucros acumulados, formados sob regra de isenção, viola diretamente esses preceitos.

Adicionalmente, como sustentado no Mandado de Segurança do SESCON, há conflito com a Lei das Sociedades Anônimas. O art. 132 da Lei nº 6.404/76 fixa prazo legal para aprovação das demonstrações financeiras pelas companhias. A Lei nº 15.270/2025 cria um descompasso entre:

•          o calendário societário, e

•          o calendário fiscal imposto pela nova regra.

Isso compromete a previsibilidade empresarial e viola a coerência do sistema jurídico, afetando todas as sociedades empresárias que seguem prazos deliberativos fixados por lei.

Finalizando, a ofensa mais grave: tentativa de tributar lucros acumulados até 2024 mediante condição societária. A situação atinge seu ponto máximo quando a lei:

•          condiciona a isenção de lucros acumulados até 2024,

•          à sua deliberação societária até 31/12/2025,

•          sob pena de tributação.

Essa solução é juridicamente impossível, pois:

1.         os lucros já são atos jurídicos perfeitos, protegidos pelo art. 5º, XXXVI, CF/88;

2.         condicionar sua isenção à deliberação posterior implica retroagir efeitos tributários;

3.         cria-se um fato gerador fictício, artificialmente deslocado no tempo;

4.         viola simultaneamente:

•          segurança jurídica,

•          confiança legítima,

•          irretroatividade tributária (art. 150, III, “a”),

•          proteção ao ato jurídico perfeito (art. 5º, XXXVI).

Conclusão

A conjugação entre a Constituição Federal, a LINDB e a jurisprudência do STF demonstram que:

•          a tributação imediata após a revogação de isenção é inconstitucional;

•          a lei não pode retroagir para alcançar lucros apurados até 2024;

•          esses lucros constituem ato jurídico perfeito e direito adquirido, blindados pelo art. 5º, XXXVI, CF/88;

•          condicionar sua isenção à deliberação posterior é violação direta da segurança jurídica e da irretroatividade tributária.

Portanto, a revogação de isenção tributária somente pode produzir efeitos após a anterioridade e nunca pode alcançar períodos já encerrados e juridicamente perfeitos, sob pena de inequívoca inconstitucionalidade.

Dr Ronaldo Corrêa Martins é CEO e Fundador do Escritório RONALDO MARTINS & Advogados

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