ARTIGO – E A CABOTAGEM?

Mauro Lourenço Dias (*)

Aproveitando que
despertou para a necessidade de que o País precisa se tornar mais competitivo
e, portanto, necessita desatar o nó logístico que impede o seu crescimento, o
governo federal deveria também colocar na ordem do dia a questão da cabotagem.
Como se sabe, embora conte com uma costa navegável de 7.500 quilômetros de
extensão e mais de 30 portos e vários terminais privativos, o Brasil não tem
sabido explorar de maneira rentável esse meio de transporte.

Basta ver que
hoje esse modal representa apenas 9,6% da matriz brasileira de transporte,
número que é extremamente modesto se comparado com os 37% movimentados pela
União Europeia e os 48% transportados pela China, segundo dados do Instituto de
Logística e Supply Chain (Ilos), do Rio de Janeiro. É verdade que, em outros
tempos, quando as ligações por rodovia e ferrovia eram bem precárias, a
cabotagem, na medida do possível, constituía o meio mais utilizado para o
transporte de carga geral e a granel. Mas isso se deu há um século, antes do
desenvolvimento do modal rodoviário e da chegada das indústrias
automobilísticas.

É certo que o
desenvolvimento de um modal não teria necessariamente de significar o
estrangulamento de outro, mas a verdade é que foi isso o que ocorreu no Brasil,
levando de roldão também o modal ferroviário, com o conseqüente sucateamento da
malha que, bem ou mal, unia regiões importantes do País, especialmente no
Sudeste.

Hoje,
irremediavelmente, em função da incúria de governantes passados, não há outro
remédio a não ser tratar de convencer a iniciativa privada a investir nesses
dois modais. No caso da cabotagem, seriam necessárias medidas para incentivar a
recuperação desse modal que, antes de tudo, é o que menos polui, dado relevante
numa época como a nossa que é marcada por uma consciência ambiental que nunca
existiu em outros tempos. Sem contar que a cabotagem é também o modal que
registra os menores índices quanto ao risco de roubo e avaria de cargas.

É claro que a
cabotagem não oferece só vantagens a quem a utiliza. Fosse assim, seria muito
mais utilizada. Uma pesquisa do Ilos mostrou que, entre os pontos desfavoráveis
desse meio de transporte, estão a concentração de volumes em embarques únicos,
a oferta insuficiente de escalas dos navios, o risco de aumento de estoques, o
maior tempo de viagem e uma burocracia semelhante à do comércio exterior.

Para o governo,
este último obstáculo seria o de maior facilidade de remoção, pois não é
admissível que uma mercadoria que não saiu do País seja vista da mesma forma
como aquela que vem de fora. Isso foge à luz da razão. Obviamente, para que
outros obstáculos sejam superados, seria necessário adotar uma política que
combatesse diretamente os problemas de infraestrutura do modal.

Essa política
deveria incluir uma série de incentivos a investimentos na capacidade
produtiva, na compra de navios novos e na melhoria das instalações portuárias.
Além disso, há um entrave há muito apontado pelos armadores que é o alto custo
do bunker, combustível utilizado para movimentar as embarcações. Com razão, os
armadores pedem um tratamento tributário de combustíveis igual ao dispensado
aos navios de longo curso.

É claro que há
outros obstáculos, como a escassez de mão de obra qualificada. Mesmo assim, é
de assinalar que houve um crescimento médio de 8% nos últimos anos da carga de
cabotagem em contêineres, segundo o Ilos. E que essa expansão vem se dando pela
intensificação da utilização do contêiner pela indústria, resultado também da
melhoria nas instalações portuárias. Em outras palavras: a cabotagem só precisa
de um empurrão para que volte a ser um modal em franco desenvolvimento e de
futuro promissor.

 
(*) Mauro Lourenço Dias, engenheiro
eletrônico, é vice-presidente da Fiorde Logística Internacional, de São
Paulo-SP, e professor de pós-graduação em Transportes e Logística no
Departamento de Engenharia Civil da Universidade Estadual de Campinas
(Unicamp). E-mail: [email protected] Site: www.fiorde.com.br

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