ARTIGO DO JURISTA LUIZ FLÁVIO GOMES

27 de setembro de 2014.
Brasil será potência mundial
 Luiz Flávio Gomes
No
decurso da Copa do Mundo recebi e conversei muito com alguns amigos
estrangeiros. Eles estavam encantados com nosso país, com a hospitalidade, com
a culinária, suas belezas naturais, suas cidades pujantes, estádios bonitos
etc. Um deles, visivelmente o mais entusiasmado, dizia que o Brasil se
converteria, em breve, em uma grande potência mundial, “na ciência e na
tecnologia, na educação e na cidadania, no agronegócio e na indústria, na
produtividade e na competividade etc.”
Fiquei me
perguntando qual seria o milagre que iria transformar nosso país em um paraíso.
É certo que não podemos negar as qualidades extraordinárias do Brasil, mas ao
mesmo tempo sabemos que estamos mergulhados num caos profundo, sobretudo porque
sempre fomos governados por pessoas que sempre pensaram mais nelas que nos
interesses gerais. Ponderei aos meus amigos que somos dois brasis (um com a
proa voltada para a civilização e outro muito atrasado – Brasildinávia e
Brasilquistão). Somos cordiais (agreguei), mas matamos 57 mil pessoas por ano;
somos hospitaleiros, mas campeões do mundo em violência contra os professores;
matamos 12 mulheres a cada 24 horas, 130 pessoas diariamente em acidentes de
trânsito etc.
Ao meu
interlocutor ainda sublinhei o seguinte: como pode o Brasil vir a ser uma
potência mundial respeitada, se ele conta ainda com tanta violência (e a
violência é sinal de atraso e de barbárie, não de evolução). Dei-lhe alguns
números: em 1980, o Brasil era o quarto país mais violento do mundo, dentre 23
(só temos dados disponíveis de 23 países nesse ano). Em 1995, dentre 80 países,
passamos para a sexta posição. Já em 2000, passamos a ser o sétimo mais
violento do mundo, num total de 98 países: pouco avanço, devido ao aumento
contínuo na taxa de mortes.
Em 2010,
de acordo com levantamento realizado pelo Instituto Avante Brasil, o Brasil
passou a ser o 20º país mais violento, dentre 187 países. Em 2012, nesse grupo,
chegou ao 12º lugar. Em 2010, o Brasil foi responsável por 52.260 homicídios,
ou uma taxa de 27,3 mortes para cada 100 mil habitantes; em 2012, apresentou um
crescimento de 7,8% em números absolutos, registrando 56.337 mortes e uma taxa
de 29 para cada grupo de 100 mil habitantes.
Com esses
números, perguntei, como pode o Brasil se tornar uma potência mundial? Ele me
respondeu:
“Há
muita coisa para se fazer, porém, uma delas será absolutamente imprescindível,
porque é a primeira de todas: reconhecer que a cultura do Ocidente está em
franca decadência. Essa é a raiz de praticamente todos os problemas dos países
ocidentais, que estão ameaçando concretamente o futuro das gerações vindouras;
as pessoas estão perdidas e as instituições se encontram falidas. Tudo isso nos
impede de viver uma vida plena e satisfatória. Algumas das nossas sociedades
estão invertebradas. Outras são, desde a origem, invertebradas, sobretudo do
ponto de vista moral e ético”.
Lamentavelmente,
eu disse, o Brasil se encaixa no segundo grupo: somos um país invertebrado
moralmente, desde o descobrimento (em 1500). Essa é a nossa peste invisível,
que aqui se espalhou com a postura individualista e extrativista dos
conquistadores, que transmitiram esse vírus maligno de geração em geração,
corroendo de forma profunda a espinha dorsal que rege as relações humanas e
sociais, afetadas até à raiz pela nossa forma de pensar, nossas opiniões,
nossos juízos e nossos atos, pouco comprometidos com a vida saudável em
sociedade.
Meu
interlocutor concluiu: “O bloqueio ético que invadiu a cultura ocidental
nos impede de pensar coletivamente. Cada um busca a satisfação exclusiva dos
seus interesses, a realização dos seus desejos (cada um por si e ninguém pelo
todo). Essa é uma cultura nitidamente alienante e decrépita, que altera nossa
capacidade de raciocinar, assim como nossos sentidos e chega mesmo a destruir
nossa própria identidade e nossas ideias, projetando-nos para um niilismo
absoluto, onde reina a ausência de regras (anomia) e de autoridade, assim como
de crenças coletivas e tradições”.
Antes que
ele encerrasse seu discurso indaguei: “Vivemos ao sabor dos ventos, sendo
indiferente para nós se eles sopram para a esquerda ou para a direita, para
frente ou para trás, para o progresso/civilização ou para a barbárie?”.
Ele
prosseguiu: “Nada mais atinge nossa sensibilidade, ainda que se trate de
um ato extremamente cruel e desumano. Somos indiferentes à dor alheia, ao
sofrimento dos demais. As sociedades invertebradas estão fulcradas na crença e
no pensamento de que só se considera como realização pessoal a que se alcança
mediante a satisfação dos desejos mais primários, das pulsões mais primitivas,
que passaram a constituir o padrão de referência para valorar as consequências
dos nossos atos. O bem absoluto é a satisfação dos nossos interesses, pouco
importando o que eles significam para o progresso ou retrocesso da comunidade,
da ética e da moral. O bem supremo da vida é a realização do nosso desejo, dos
nossos interesses, ainda que alcançados por meios aéticos e imorais, ainda que
conquistados por formas tortas e deploráveis, com violação das frouxas e
fluidas regras procedimentais. Trocamos a razão objetiva pela razão subjetiva,
ou seja, pelo que manda a vontade de cada um, sem considerar que os humanos não
vivemos isolados dos outros humanos”.
LUIZ
FLÁVIO GOMES, jurista
e diretor-presidente do Instituto Avante Brasil.
professorLFG.com.br e
no twitter: @professorlfg
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